segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

De Quem é a Culpa – Chuvas 2011 – Parte I

Para quem gosta de apontar culpados, poderíamos dizer que o primeiro responsável foi D. João VI, que, em 16 de maio de 1.818, assinou decreto autorizando o estabelecimento de uma colônia suíça na então Fazenda do Morro Queimado. Como parte de um projeto de "branqueamento" da população brasileira, centenas de famílias foram alojadas às margens do rio Bengalas, nas suas áreas de várzea, e logo sofreram com as primeiras enchentes.

Posteriormente receberam suas glebas, divididas sem nenhum critério. Foram ocupadas encostas, vales e margens de rios. Esse tipo de ocupação perdurou ao longo dos quase dois séculos de existência de Nova Friburgo. Quantos rios e córregos do município tiveram seus cursos retificados, como o Bengalas? Quantos tiveram suas margens ocupadas e seus leitos estrangulados, como o rio Cônego e o córrego dos Inhames? Quantos outros foram transformados em galerias subterrâneas, como o que agora retomou seu espaço na Vila Amélia?

O problema da ocupação desordenada, que não é só do pobre, vide o teleférico e o Parque da Pedra, não se resolverá em um ou dois anos, provavelmente nem uma década seja suficiente para corrigir os erros cometidos em dois séculos de vida do município. É preciso um novo modelo de desenvolvimento, e boa parte dele está expresso no Plano Diretor Participativo, tornado lei municipal em 2007.

Não há registro na história de Nova Friburgo de uma chuva de tamanha magnitude em tão curto espaço de tempo. Quando um fenômeno como esse acontece em área desabitada por humanos, ainda assim as conseqüências são dramáticas. A geografia da região se transforma, os deslizamentos movimentam grandes quantidades de terra, rochas e árvores, modificando a topografia das encostas, dos vales e os cursos dos rios. Já em regiões povoadas, assume as feições trágicas a que assistimos estarrecidos.

Com o conhecimento e a técnica atual pode-se minimizar alguns efeitos das fortes chuvas, mas não evitar completamente os seus terríveis danos. Monitoramento e sistemas de alerta podem servir para poupar vidas humanas e diminuir as mortes. Estudos como os que foram realizados pela prefeitura na gestão passada, como o Plano Municipal de Redução de Riscos e o Plano de Macrodrenagem, quando realizadas as obras necessárias, que exigem recursos do Estado e da União, pois custam muito mais do que o orçamento do município suporta, podem diminuir também a perda de vidas e os danos materiais. 

Investimentos em habitação popular também são fundamentais. Sem subsídio público, como o que existe no programa Minha Casa, Minha Vida, não se resolve o problema das ocupações das áreas de proteção permanente e das áreas de risco, que são as que não têm valor para o mercado imobiliário e, por este motivo, as que sobram para a população de baixa renda.

Inconformados com a nossa impotência diante dos fenômenos naturais, nos acostumamos a sair em busca de culpados. As consequências poderiam ser minoradas, sem dúvida, mas não neste modelo de organização política, econômica e social em que vivemos. O ordenamento territorial, a habitação, o saneamento e o transporte, não podem ser deixados a cargo da “mão invisível do mercado”. Há que se ter políticas públicas e de estado fortes nestes setores.

É preciso uma profunda transformação na sociedade brasileira, que desloque o eixo das prioridades do capital para o social, o ser humano e suas relações com a natureza. Só assim, em uma nova sociedade socialista e democrática, participativa e plural, poderemos efetivamente promover as mudanças que atendam às necessidades humanas e não aos interesses financeiros. Fora disso, tudo o mais não passará de paliativo.

Um comentário:

  1. Muito lúcido o post! Eu, assim como vcs, fiquei muito triste com o que ocorreu em Nova Friburgo. Me doeu dentro! E ainda dói!
    Mas, concordo com vcs, não há um único culpado! Existe uma conjunção de fatores que não foram felizes...
    E concordo tb quanto a necessidade de uma política pública que coloque-se a serviço da ética pelos direitos de moradia saudável. Citando Leonardo Boff "materialmente sustentável, psicologicamente integrada e espiritualmente fecunda."
    Grande abraço

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